Sempre
acreditei que ter o que falar é posterior ao ato de muito ouvir, ler,
analisar...enfim! Por isso, há temas com os quais não me envolvo. Não por não
ter opinião; opinião todo mundo tem sobre tudo! Não por covardia, mas
simplesmente pela necessidade de precisar conhecer melhor antes de tomar
posição.
Quando
– por exemplo – no jornalismo, é necessário fazer uma matéria sobre uma
proposta de emenda constitucional (PEC), sempre procuro fazer com que o
primeiro passo seja ler a tal emenda (além da própria Constituição) e depois
confrontar o texto com o que é dito sobre ele. Não raro ligo para colegas
advogados com um único intuito: busca de orientação, opiniões divergentes e
mais leituras.
Assim,
vale para outros assuntos. O “inbox” do meu facebook é recheado de diálogos
“chatos para caralho” dos mais variados temas, com colegas estudiosos em suas
áreas. Vão do Direito às religiões. É uma prática minha. As conversas
arquivadas, por vezes, são relidas com livros sobre o assunto ao lado.
Madrugadas em claro. Sempre assim quando me interesso por um tema.
Pode
ser um defeito meu! Não quero ser senhor da verdade (até porque acho que este
senhor é sempre o maior dos imbecis); mas acredito que atividade do jornalista
tem que ter este garimpo. Nunca embarcar no senso-comum, no mais óbvio. Se o
senso-comum e o mais óbvio forem o real, a pesquisa e o estudo – naturalmente!
– darão razão a quem se tem.
Cito,
por exemplo, o romance de Umberto Eco – O nome da Rosa! – como um belo exemplo
do que aqui falo. Quem o leu deve lembrar da figura do inquisitor de Toledo,
Bernard Gui. Ele moldou – para muita gente – a visão da inquisição na Idade
Média. No romance, o personagem histórico traz inclinações ao sadismo, com seu
capuz é mais um monge inclinado ao autoritarismo.
O
livro de Umberto Eco é uma reflexão fantástica sobre o conceito de Deus e o que
se faz em nome dele ou do conceito em si. Mas, a construção romanceada de
Bernard Gui foi injusta. Para saber disto, ir à fundo em outros textos
históricos, como os de Roman Konik, que não é tão famoso quanto Eco. Konik faz
um levantamento histórico sobre o monge e mostra que ao longo de sua vida, Gui
jugou 913 pessoas.
Destas,
apenas 42 foram entregues aos tribunais como perigosos rebeldes. Destes, muitos
– pela forma como Gui conduzia os processos – foram absolvidos. Os números
mostram que o tirano sádico tinha uma inclinação pelo réu. E aqui falo apenas
de Gui, não da Inquisição como um todo. O exemplo é ele! Porém, melhor que o
estudo histórico é o romance. É a polêmica! Melhor que o texto, muitas vezes, é
a melhor manchete. Resistir a esta tentação. Não morder a maçã. Enfim...nem
sempre é fácil. Aliás, nunca é!
Sobretudo
quando nossos egos estão imersos no processo. Sempre estarão. Quem não gosta do
reconhecimento de sua produção intelectual? Eu mesmo me sinto honrado quando
convidado para palestras, debates, e vejo a possibilidade de ensinar e aprender
dentro de um processo que gosto de chamar de bom combate. Quem – neste mergulho
– não tem suas paixões e seus preconceitos. Ora, como fã de Eco, vocês não
imaginam o quanto foi difícil reconhecer a razão de Konik. Como ateu então?
Obriga-me a fugir de um maniqueísmo que seria mais fácil na defesa do que eu
penso. Nada do que digo aqui é fácil para mim. É uma tarefa árdua. Árdua como a
maiêutica socrática.
Árduo
como perder um domingo ensolarado na necessidade de rever os conceitos de Kant
dentro do próprio Kant após algumas críticas propostas por Miguel Reale. Seria
injusto crer em Reale de primeira só porque ele é Reale. Eis outra alusão para
exemplificar o que aqui falo.
E
assim vai desde as opiniões envolvendo o novo livro do Lobão (que foi odiado
antes de ser lido em função das manchetes que desagradaram alas progressistas)
até outros assuntos que dominam a mídia e os especialistas em textos curtos e
na polêmica da semana. Lembrou-me o compositor Humberto Gessinger: “todo mundo
tá relendo o que nunca foi lido; todo mundo tá comprando os mais vendidos”.
Pois
é, qualquer nota, qualquer coisa que se mova é um alvo...e os atiradores de
plantão não leram sequer o manual do rifle! Se fosse um jogo de futebol, era só
mandar o juiz para casa que do pescoço para baixo tudo vira canela. A bola? A
bola que se foda...
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