quinta-feira, 11 de julho de 2013

As lições de O Zero e O Infinito



Esses caras muito bons, extremamente santos, sempre prontos para te abordar na esquina com os argumentos irrefutáveis de que você precisa acordar e aderir a luta por um mundo melhor, me preocupam.

Não que eu não queira um mundo melhor! Quero sim. Tento me pautar por isto no dia a dia. Pensar sempre no próximo e ser o mais justo possível. Os problemas são os caminhos tortuosos que visam sufocar a liberdade e abrir mão de determinadas garantias para se atingir um objetivo maior, um bem religioso (não no sentido místico da palavra, mas no de religação com uma causa maior que nós), um amanhã que para ser atingido precisamos abrir mão do hoje e que possivelmente não desfrutaremos.

O BEM SUPREMO que nos leva a aceitar TUDO na certeza de estamos caminhando, marchando, existindo, focados e acordados pela próxima geração. Somos o caminho rumo ao BEM e só eles possuem a chave, as respostas, a razão, enfim...o monopólio de virtudes elaborado para o catálogo da revolução.  Abordarão nossos esqueletos alienados na esquina. Mandarão na bucha: “e aí, tá com a gente, ou é mais um do MAL?”.

Tomado de assalto, muitos aderem à visão romântica alimentada pela subjetividade do desejo mais que natural por um mundo melhor. Logo em seguida, sufocada a subjetividade, outro sentimento impera. Você até pode discordar dentro do grupo. Mas, jamais externe isto. Lá fora é guerra! Defenda os seus, ame os seus. São eles que querem o mundo melhor. Os demais, mais inimigos.

Vão te transformar em gente mesquinha, tacanha, pequena, gente tão do mal, mais tão do mal que prefere manter a honestidade a ter que cometer crimes pela causa. Os bravos tão bem ilustrados por George Orwell em sua Revolução dos Bichos.  O sentimento tão bem questionado por Hermann Hesse em seu O Lobo da Estepe, ao vagar perdido entre tanto maniqueísmo.
Lembra-me Arthur Koestler em seu O Zero e O Infinito: “Pois o movimento não tinha escrúpulo; rolava inexoravelmente rumo à sua meta depositando os cadáveres dos afogados nas reentrâncias de seu curso. O curso tinha muitas curvas e reentrâncias; essa era a lei da sua existência. E quem não fosse capaz de acompanhar seu curso tortuoso era relegado à margem”.

São estas reentrâncias presentes em alguns movimentos por “um mundo melhor” que preocupa. São reentrâncias determinadas pelas lideranças que surgem, que erguem o cajado para dividir o mar no meio. São os que gritam: “vai comigo rumo à causa, ou ficará do lado do MAL”. Como camaleão, criam cores e justificativas para tudo. O IDEAL em si será sempre mantido puro como o norte.

Fala Koestler: “o Partido só reconhecia um crime: desviar-se do curso traçado. E só um castigo: a morte”. Em tempos modernos, a aniquilação do oponente por meio de estratégias desonestas intelectuais o suficiente para desmoralizá-lo. Um tipo de morte que não física, mas que não permite que ele dialogue. Ele tem que passar a se justificar sempre. Ele é lançado à fogueira. Todos os munidos dos ideais puros para cima do inimigo, já.

Por fim, com foco do BEM SUPREMO e do monopólio das verdades, proferiu certa vez o bispo Von Nieheim: “quando tem a existência ameaçada, a Igreja é dispensada dos mandamentos da moralidade. Visando a unidade, o emprego de todos os meios é santificado, até mesmo a astúcia, a traição, a violência, a simonia, a prisão e a morte. Pois toda ordem é em prol da comunidade, e o individuo deve ser sacrificado ao bem comum”. Substituam Igreja por qualquer grupo monopolizador de virtudes (de qualquer lado do tabuleiro) e não estranhe as semelhanças.

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